Assentados à mesa após a
janta, Vito e Léa (nomes fictícios), hóspedes em O Refúgio, Clóvis, amigo que
revíamos depois de mais de quinze anos, e a nossa família, falávamos sobre fé,
oração, ação de Deus e coisas como essas. A certa altura, Vito, apelou para um
testemunho que o casal achava incontestável: “Minha filha tinha uma problema no
joelho; depois de mal sucedidas andanças por consultórios, nós a levamos para
Minas, para uma operação espiritual com o Dr. Fritz – temos duas radiografias,
antes e depois, para mostrar que ela foi curada”. Eu já me preparava para um
uma incursão no esquema doutrinário bíblico, quando Clóvis atalhou: “Não quero
bênçãos que não venham do meu Deus”. Boa, Clóvis! Valeu! A coisa é essa mesma.
Efésios 1.3 diz que o Deus e Pai de nosso Senhor
Jesus, “nos tem abençoado com toda sorte de bênção espiritual nas regiões
celestiais em Cristo, e 2Pedro 1.3 reitera, dizendo que “nos têm sido doadas
todas as coisas que conduzem à vida e à piedade, pelo conhecimento completo
daquele que nos chamou para a sua própria glória e virtude”. A questão é que somos
tomados de dúvida em relação à palavra de Deus, e, consumidos por diversas
ansiedades, vivemos à cata de bênçãos. Queremos uma segunda, terceira, e mais e
mais “bênçãos” que jamais saciam a sede de santidade instantânea e indolor e de
poder espiritual sem obediência e dependência da vontade de Deus. Parodiando a
vai a canção: “e se Deus não der, eu vou me danar, e chega”.
Em uma das ocasiões em que a Beth esteve bem
doente, uma senhora de uma das igrejas que servi falou ao telefone: “Pastor,
por que você não leva a Beth para receber a oração do pastor ‘tal e tal’; ele
orou por mim, e eu estou curada de um câncer”. “Obrigado pelo cuidado, irmã” –
iniciei a resposta com maior cuidado – “mas o Francisco, o zelador da igreja,
já orou comigo, diversas vezes, assim como os presbíteros e outros irmãos...”
Antes do click do telefone
desligando, ouvi um resto de frase: “O sr. é mau, pastor”. A irmã morreu um mês
depois, e a Beth, pela mesma graça que levou a irmã para o céu, ainda sofre as
dores deste mundo e experimenta o contentamento do Senhor.
Se creio na oração? Com toda certeza, pois é ordem do
Senhor. Se creio no poder da oração, aí depende do conceito. Se poder da oração for uma figura do poder
de Deus para responder orações como bênção concedida pela graça mediante a fé
em Cristo Jesus, então, estou dentro
para rogar, interceder, jejuar e, especialmente, para receber a bênção de obter
o pedido ou para obter a bênção de sabê-lo negado. Isto, porque sei também que
o instrumento da oração não foi concedido por Deus que nós o usássemos para
forçar Deus a “liberar a bênçãos”. Não há como forçar o braço do Todopoderoso
Soberano. A oração é uma bênção para implementar o conhecimento da vontade de
Deus no coração e nas mãos do crente. Por meio dela, o crente aprende a
comunhão com Deus e, nele, a comunhão com os irmãos. Na comunhão em oração, os
crentes exercitam, individual e coletivamente, o conhecimento dos mandamentos e
promessas do Senhor, confiantes de que suas vidas estão nas mãos dele, “que é
poderoso para fazer infinitamente mais do que tudo quanto pedimos ou pensamos,
conforme o seu poder que opera em nós” (Efésios 3.20).
Ao falar de oração em tempos de perseguição, doença
ou outras aflições, Tiago (5.10-20) inicia, dizendo: “Irmãos, tomai por modelo
no sofrimento e na paciência os profetas, os quais falaram em nome do Senhor ”.
Infelizmente, muitas vezes, nós tomamos o modelo de curandeiros “evangélicos”
que declaradamente adoram a oração que fazem, e não ao Senhor da oração que a
atende. Tiago diz também que tudo o que falamos deve ser definido, tanto o sim
quanto o não, e, para isto, usa a ilustração da unção com óleo. A unção é a
bênção para o usufruto dos mandamentos e promessas do Senhor. A unção para o
cumprimento de um chamado especial, como no caso de Samuel e Davi, era marcada
com o óleo derramando por um profeta do Senhor sobre a cabeça do agraciada.
Significava que a autoridade não residia no profeta nem no rei ungido, mas provinha
da graça de Deus a ser recebida mediante a fé. Não será por meio da oração dos
adoradores de Baal, ou dos adoradores da prosperidade que não permanecem no
pacto em que Deus é o rei soberano e, nós, seus príncipes vassalos, que
veremo0s a verdadeira bênção que procede do Pai. No caso da oração para a cura
a ser feita por presbíteros, a unção com óleo demonstra que o poder da cura não
está no carisma de quem ora nem na força da fé do objeto da oração – mas
procede da graça de Deus. Na verdade, a fé pequena e fraca, mas poderoso é o
Senhor que a concede e faz aumentar. Sim, eu creio no Deus poderoso que atende
minha fraca oração, tal como foi sua resposta à oração de Paulo: “A minha graça
te basta, porque o poder se aperfeiçoa na fraqueza”. Neste caso, a oração tece
efeito completo, como é visto no comentário feito: “De boa vontade, pois, mais
me gloriarei nas fraquezas, para que sobre mim repouse o poder de Cristo” (2Coríntios
12.9). No exemplo de Tiago, Elias era homem sujeito a paixões e fraquezas; ele,
um dia, orou ao Senhor, dizendo que haviam matado os profetas e que, agora, ele
estava sozinho e com a vida em risco – o Senhor respondeu que havia ainda sete
mil fiéis “que não dobraram os joelhos diante de Baal” (Romanos 11:4). Este
homem fraco “como nós”, também orou a Deus pedindo chuva, e choveu!
As grandes experiências do conhecimento e da comunhão
com Deus notadas no exercício da oração são realmente grandiosas, maravilhosas,
terríveis, e deliciosas, mas proclamam a glória de Deus e não a ilusória glória
de homens. Nossos olhos deveriam fitar o Senhor de todas as bênçãos e os nossos
pés e mãos deveriam seguir seus caminhos e suas obras. A verdadeira graça não
mede homens e sempre os faz crescer; a verdadeira fé não é medida segundo o
poder de homens, mas cresce no acato à vontade do Senhor. Deus sempre responde
as orações dos seus filhos, sempre transformando o caráter deles quer para
receber a bênção pedida quer para entender a sua negação.
Wadislau Martins Gomes
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